Seu filho costuma acordar assustado ou muito agitado no meio da noite e, depois, não consegue mais dormir? Ele relata sonhos estranhos e assustadores com monstros saindo debaixo da cama ou com os pais o abandonando? No dia seguinte você passa pela mesma situação com a criança? Afinal, o que causam esses pesadelos? O que eles querem "dizer"? Como os pais podem ajudar os filhos com esses sonhos ruins? Criar personagens fictícios para assustar os pequenos, por exemplo, pode ter influência nesse processo?
Segundo Triana Portal, psicóloga clínica pela USP, os pesadelos, que costumam aparecer aos três anos de vida e desaparecem por volta dos sete anos, acontecem na fase do sono profundo. "Esses sonhos ruins, geralmente, deixam de existir espontaneamente, com o amadurecimento da criança ou a superação de uma determinada fase de estresse, bem como de uma doença ou de algum problema que esteja acontecendo na família ou escola. Alguns pais ainda subestimam as crianças e o quanto elas absorvem da problemática familiar. Portanto, situações como desemprego, a morte de um animal de estimação, a separação dos pais e as discussões entre o casal, podem, sim, desencadear esses pesadelos", diz a psicóloga.
Quézia Bombonatto, psicopedagoga e diretora da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), conta que dificilmente os pais percebem que crianças de um a três anos de idade têm pesadelos porque elas ainda não se comunicam. "Esse filho vai acordar chorando e isso pode ser por vários motivos. A mãe tem de buscar identificar se o filho acordou assim porque está molhado, porque está desconfortável ou se está assustado. Se o pequeno costuma dormir bem e acorda durante a noite assustado pode, portanto, ter tido um pesadelo", afirma.
Apesar disso, segundo a psicopedagoga, muitas vezes os pesadelos têm relação com alguma coisa que aconteceu antes de ir para cama. "Por exemplo, um conto de terror ou o estresse de ir para cama - que muitas crianças sentem - por saber que vão ficar longe dos pais. Isso pode causar medo e nervosismo, causando pesadelos", assinala Quézia.
Por sua vez, a terapeuta familiar Roberta Palermo, autora dos livros "100% madrasta – Quebrando as barreiras do preconceito" (Ed. Integrare) e "Babá – Manual de instruções" (Mescla Editorial), ressalta que os pesadelos podem indicar que alguma coisa não vai bem, ou simplesmente ser a lembrança de algo ruim ou diferente que aconteceu durante o dia anterior com a criança. Por isso, os pais precisam avaliar como foi o dia do filho: se o pesadelo não acontecer constantemente, não há o que temer. Mas, se passar a ocorrer com certa frequência, pode estar relacionado com alguma questão emocional e, então, vale a pena consultar um especialista.
"Aconteceu alguma coisa que o assustou? A criança presenciou uma briga ou assistiu a um desenho/programa de TV inadequado? Até mesmo a história do livrinho antes de dormir pode interferir na hora do sono, causando medo. O medo, então, pode aparecer durante o sono. A separação dos pais ou a véspera de primeiro dia de aula também são exemplos do que pode causar pesadelos. Nesses casos, é normal. Mas se for frequente, aí sim os pais precisam investigar o que pode estar acontecendo para gerar esses sonhos ruins", avalia Roberta.
O excesso de pesadelos na infância pode, inclusive, indicar que a criança sofrerá transtornos psicóticos na vida adulta, segundo estudo publicado em 2014 na revista científica "Sleep" que analisou dados de quase sete mil crianças com até 12 anos de idade no Reino Unido. O levantamento revelou ainda que a maioria das crianças tinha pesadelos em algum ponto da infância. E uma em cada dez delas, geralmente, entre três e sete anos, tinha pesadelos.
Também é necessário diferenciar o pesadelo do chamado 'terror noturno'. Segundo Quézia, a diferença básica é o momento em que ocorre. O pesadelo acontece na segunda metade do sono e é um sonho ruim, onde a criança acorda assustada e se lembra do que aconteceu. Já o 'terror noturno' é um distúrbio que normalmente ocorre na primeira fase da noite. "Neste caso, a criança não chega a acordar e não se lembra de nada quando acorda. Ela grita e tem crianças que até batem a cabeça. O excesso de pesadelo pode indicar uma tendência à psicose na vida adulta. Por isso, quando frequentes, é necessário procurar um especialista. Agora, o terror noturno precisa de ajuda e de uma intervenção", alerta Quézia.
"No terror noturno, a criança grita, fica com a respiração acelerada, num estado de muito pânico. Dura poucos minutos e ela pode voltar a dormir em seguida. E ela pode ter mais de um terror noturno na mesma noite, bem como nos próximos dias também", adverte Roberta Palermo.
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Ter pesadelos constantemente não é normal
'Todo mundo tem pesadelos, mas não é normal que isso ocorra com muita frequência, tornando essa situação em algo estressante. Os pesadelos não têm uma causa específica. Eles têm a ver com a situação da criança. Às vezes, ela está mais insegura sob algum tipo de pressão, por exemplo, estressada demais ou mesmo passando por situações difíceis - morte na família, a separação dos pais etc. Essas questões, somadas à rotina para a criança ir dormir, podem levá-la a ter pesadelos', explica a psicopedagoga Quézia Bombonatto, diretora da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp).
O que pode causar esses pesadelos nas crianças?
A psicóloga clínica, Triana Portal, conta que os pesadelos são normais quando os seus conteúdos são variados e acontecem de forma esporádica. No entanto, se eles se tornarem frequentes e com temáticas específicas, isso precisará ser investigado e tratado. 'Cada caso tem uma causa específica e isso é identificado por meio do psicodiagnóstico, quando necessário. A etiologia (causa) é multifatorial, mas podemos citar alguns desencadeadores como a rotina estressante (a criança que tem muitas atividades), uma família disfuncional, maus tratos, alguns problemas de adaptação no contexto escolar ou mesmo traumas específicos (assalto, violência doméstica, acidente de carro)', explica Triana, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia.
Pesadelo constante pode ser pedido de 'socorro emocional'
'Os pesadelos frequentes e com temáticas semelhantes são, muitas vezes, um pedido de 'socorro emocional', algo como a febre que nos alerta de uma infecção. Cada indivíduo somatiza de uma forma, algumas crianças apresentam enurese (xixi na cama), outras deprimem, e há as que têm pesadelos. Mas, como disse, os pesadelos que acontecem eventualmente não devem ser considerados patológicos, mas sim uma revivência de algum acontecimento estressante isolado que pode ser até um programa de TV que a criança assistiu e que a impressionou', explica Triana Portal.
Pais não devem 'criar' monstros aos filhos
Se a criança ficar com medo de voltar a dormir, um dos pais pode ficar ali no quarto com ela até que o filho adormeça. Eles só não devem mentir para seus filhos ao criarem 'monstros', como adverte a terapeuta familiar Roberta Palermo. 'Pais não podem dizer, por exemplo: 'Não vai à piscina porque tem um jacaré'! Aí, no dia seguinte, amanhece um lindo dia de sol e a criança não quer de jeito nenhum entrar na piscina. E ninguém se lembra de que, no dia anterior, 'tinha um jacaré' ali. Esse mesmo jacaré sobe pela parede, entra pela janela e ficará debaixo da cama. Ou seja, o tal jacaré mais atrapalhou do que ajudou. Tem de falar a verdade, por exemplo: não vai à piscina porque você não sabe nadar ainda e pode se afogar', conta Roberta.
Pesadelo é diferente de 'terror noturno', fique alerta!
Os pesadelos são sonhos ruins e de conteúdo assustador, e acontecem para todas as pessoas de tempos em tempos. O que é bem diferente do chamado 'terror noturno', um distúrbio do sono que acomete crianças com prevalência maior em meninos. Apesar disso, meninas também podem apresentar o problema.
O distúrbio, explica Triana Portal, tem episódios repetitivos, com despertar abrupto do sono, gritos de pânico, medo intenso e sinais de excitação. Ainda durante o sono, a criança pode se debater, falar, resmungar, sair andando pela casa. Isso tudo acontece no estágio 'REM' do sono (fase de intensa atividade cerebral e movimentos rápidos dos olhos), que ocorre geralmente na primeira hora depois de ir dormir.
'O problema causa sofrimento, insegurança, ansiedade, cria o 'medo de ter medo'. Dificilmente os pais conseguem confortar a criança durante o episódio, há um esquecimento do evento', explica a psicóloga clínica.
Como posso ajudar meu filho depois do pesadelo?
'Primeiro, faça com que o momento em que a criança vai para a cama seja tranquilo. Os pais devem evitar contar histórias aterrorizantes, por exemplo. E quando a criança tiver algum pesadelo, eles devem procurar acalmá-la, colocá-la no colo. Os pais também devem deixar que o filho expresse seus sentimentos, suas emoções, mas não devem levá-lo para a cama do casal quando isso ocorrer. Isso não ajuda porque ela vai criar um hábito que não é bom', recomenda Quézia Bombonatto.
Acolher é a melhor forma de ajudar o filho após o pesadelo
Os pais devem acolhê-los, acalmá-los, dizer que foi um pesadelo, que não é real e que o filho pode dormir. Devem ficar com a criança até ela adormecer, mas sempre demonstrando paciência. Observe ainda se esse pesadelo se manterá ou não. 'Quando você mostra essa segurança, eles se sentem mais seguros. Com isso, entendem que o pesadelo pode ser um sinal de que está sendo digerida alguma coisa que aconteceu no nosso dia ou que acontece por um estresse, uma mudança ou mesmo sem nenhum motivo aparente', explica Romilda Alves, professora de Educação Infantil do Colégio Nossa Senhora do Morumbi, em São Paulo.
Nada de dizer coisas como 'volta a dormir logo e não enche'
Nada de dizer ao seu filho frases como 'larga a mão de ser bobo', 'volte a dormir logo', 'deixa de frescura e vai dormir' ou afirmações aterrorizantes semelhantes. Ouça a criança, conforte-a, respeite o medo dela e fique por perto até que se acalme. 'Parece brincadeira, mas muitos pais ainda fazem isso. Menosprezar o sentimento da criança, seu medo, sua angústia é sem dúvida um desserviço. Isso certamente não ajudará seu filho', adverte Triana Portal.
Estratégias para evitar os pesadelos
'O ideal é que os pais evitem jogos de computadores violentos, TV no quarto, 'tablets', 'smartphones' e afins na cama da criança. As luzes dificultam a produção de melatonina, um hormônio que regula o sono e começa a ser produzido pelo organismo ao anoitecer. A dieta, preferencialmente, deve ser leve à noite. Os pequenos devem ir relaxando antes mesmo de dormirem para que o sono seja tranquilo e para o cérebro possa assimilar as informações aprendidas durante o dia, é nessa hora que o conteúdo se fixa', recomenda Triana.
Procure ajuda se os pesadelos forem constantes
Caso os pesadelos sejam constantes (durante dois meses, três vezes por semana, por exemplo), não hesite em procurar ajuda profissional, mas dê um passo de cada vez. Primeiro acolha o seu filho, depois observe se esses pesadelos são constantes e o motivo deles. Os pais, muitas vezes por ansiedade, encurtam os caminhos. Mas eles devem entender que cada fase tem exige um tipo de cuidado e os pais precisam ir em busca, primeiro, de uma orientação para eles e, se for o caso, também para a criança.
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